quinta-feira, 18 de novembro de 2010

O desrespeito às diferenças

No último final de semana prolongado, pudemos ver nos noticiários as agressões ocorridas nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. Quatro jovens foram agredidos na Avenida Paulista, em São Paulo, e um jovem foi baleado no Rio de Janeiro após a parada gay. Embora tenha sido negado pelos agressores, em ambos os casos há fortes indícios de que as agressões tenham ocorrido por homofobia, ou seja, por preconceito.
No caso das vítimas em São Paulo que foram agredidas por quatro jovens de classe média, eles relataram que os jovens partiram em direção a eles e começaram a agredir sem justificativas, apenas os chamando de ‘bichas’, ‘maricas’. O jovem baleado no Rio relata que um grupo de jovens gays foram ofendidos e humilhados por quatro militares. Os demais jovens foram liberados, mas ele e o parceiro ficaram retidos no local porque o seu companheiro estava sem o RG. Nesse momento foi empurrado e levou um tiro na barriga.
Situações como essas, embora sejam muito mais comuns do que possamos imaginar, nos chocam ao nos depararmos com a agressividade gratuita movida pelo desrespeito às diferenças e pelo preconceito.
A livre expressão é garantida pela constituição em países democráticos como o Brasil e consiste no direito da pessoa manifestar livremente opções, idéias e pensamentos. Entretanto este não foi sempre um direito garantido às pessoas no país. No período dos governos militares, a censura foi utilizada como forma de conter e impedir a publicação de determinadas informações que eram tidas pelo governo como ameaçadoras. Esse período foi marcado por extrema violência e forte repressão à liberdade de expressão. Na atual Constituição Federal, promulgada em 1988, várias inovações foram conferidas em relação a liberdade de manifestação do pensamento, dando maior amplitude no rol de direitos e garantias individuais.
Embora a liberdade de expressão seja um direito hoje garantido em constituição, ainda vemos constantemente manifestações de intolerância e extremismos.
Se expressar livremente, poder manifestar idéias e desejos em todos os espaços, acaba sendo confundido pelas pessoas como possibilidade de se fazer o que se bem entende sem se pensar que vivemos em uma sociedade, por isso, é necessário respeito ao espaço do outro e respeito às diferenças. Se expressar livremente acaba sendo entendido por passar por cima do outro. E nesse sentido, o que era para ser vivido como algo positivo, o fazer valer os nossos direitos, acaba se tornando manifestações violentas de radicalismo e preconceitos. E isso se dá por diversos grupos de ambos os lados como os gays, os negros, as mulheres, os pobres, os ricos, os cristãos, os muçulmanos.
Sociedade pode ser definida como o conjunto de pessoas que compartilham propósitos, gostos, preocupações e costumes, e que interagem entre si constituindo uma comunidade. Vale pararmos e refletirmos o quanto temos contribuido para a vida em sociedade ou o quanto temos contribuído para a disseminação da intolerância e preconceitos.

Valdeli e Ana Angélica

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

O Sentido da Vida

Desde a antiguidade, até os dias atuais, a busca pelo sentido da vida atravessa nossos pensamentos. Inúmeros filósofos, pensadores e religiosos vêm tentando responder essa questão, e como conseqüência diferentes correntes filosóficas e ideológicas foram construídas a partir das respostas encontradas.
Na nossa prática clínica, freqüentemente nos deparamos com esse questionamento. Afinal, qual o sentido da vida?
A dificuldade em responder a essa questão está assentada em um engano que cometemos, e o engano está em acreditarmos que existe uma única resposta a essa questão, de aplicabilidade universal.
O fato é que a resposta a essa questão não é dada “de fora pra dentro”, não pode ser dada pelo Outro, seja ele quem for, mas é uma resposta que é construída dentro de cada um de nós, a partir da singularidade de cada um.
O sentido da vida é sempre individual, ou seja, não há um sentido genérico, mas somente o sentido que a minha vida tem. Sendo assim, a pergunta que é possível de ser respondida é: “qual o sentido da minha vida?”
Para encontrar essa resposta é preciso que voltemos o nosso olhar para dentro, e que façamos reflexões apoiadas na análise de quem somos, do que desejamos, de quais são os nossos valores, quais as expectativas que temos, em que momento de vida nos encontramos e onde queremos chegar. O que dá sentido à minha vida, certamente não é o que dá sentido à vida do meu vizinho, do meu colega de trabalho, que certamente é uma pessoa diferente de mim, com experiências de vida diferentes e desejos diferentes. Assim também, o sentido da vida de um adolescente não é o mesmo que o de um homem aos 50 anos, nem tampouco o sentido da vida de uma mulher aos 30 anos que mora em uma pequena cidade do interior é o mesmo de uma mulher na mesma idade que mora em um grande centro urbano. A idade, a cultura, as possibilidades que cada um tem na sua vida vão interferir na construção dessa resposta.
Alguns podem argumentar que para determinados grupos, sejam religiosos ou ideológicos, é possível a constituição de um sentido de vida comum. Não é verdade, ainda que em alguns momentos a exteriorização de um determinado modo de ser possa nos levar a entender que isso seja possível. Na verdade, o que acontece nesses grupos é que as pessoas podem ter ideais em comum, e isso é diferente de ter um sentido de vida em comum. Os ideais que temos colaboram na construção do sentido da vida, mas são construtos diferentes. Ideal de vida é o que aspiramos, e sentido de vida é o entendimento que temos sobre a nossa existência, é a interpretação que damos para o que sentimos e vivemos. Podemos ter aspirações em comum, mas os significados que atribuímos a essas aspirações diz respeito à individualidade do nosso existir.
É importante que saibamos também que aquilo que dá sentido à nossa vida hoje, pode não dar amanhã, porque somos seres em constante processo de transformação e desenvolvimento pessoal e na medida em que mudamos, mudam nossos ideais e desejos.
Então, quando nos depararmos com essa pergunta, olhemos para dentro de nós mesmos, porque somente o olhar interno, e os novos olhares que temos sobre nós é que nos permitirão o encontro e a construção de significados para o nosso sentido de ser... e de existir!

domingo, 3 de outubro de 2010

Depressão na Infância e Adolescência

A depressão é um transtorno afetivo que acomete de 1% a 2% das crianças e de 4% a 8% dos adolescentes. É uma doença grave, uma vez que causa prejuízos em todas as áreas do desenvolvimento, podendo cronificar-se ao longo do tempo e colocar a própria vida da criança ou do adolescente em risco, uma vez que está associada ao aumento de incidência de suicídios nessa população.
O diagnóstico de depressão exige muito cuidado e atenção por parte dos especialistas, uma vez que sinais e sintomas sugestivos de depressão podem, em alguns casos, ser reativos a uma determinada fase de desenvolvimento. No entanto, faz-se necessário a atenção dos pais e profissionais que atendem essa população para a presença dos seguintes sintomas:
- irritabilidade
- aumento ou redução de peso e apetite
- sonolência
- dificuldade de concentração
- perda de interesse por atividades que despertavam prazer e satisfação
- isolamento social
- presença de pensamentos mórbidos
- mudanças bruscas de comportamento.
Quando observados esses sintomas, deve-se procurar um medico especialista em psiquiatria infantil, uma vez que em alguns casos o uso de medicação é fundamental. O acompanhamento médico cuidadoso, associado à psicoterapia e orientação de pais é o que vai permitir uma rápida remissão dos sintomas e um controle sobre a depressão.
Infelizmente esta é uma realidade que vem apresentando um crescimento constante sendo atualmente considerada uma questão de saúde pública. A rápida intervenção é o que evitará prejuízos profundos e permanentes em um momento que o paciente se encontra em pleno processo de desenvolvimento.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Algumas considerações sobre os (des) encontros afetivos

Apesar de ouvirmos com uma grande freqüência de homens e mulheres, nas diferentes faixas etárias e estratos sócio-culturais, que todos estão em busca de “construir relações afetivas”, o que observamos é que a cada dia as pessoas estão cada vez mais sozinhas e vivendo um sem-números de desencontros em suas vidas. Uma explicação bastante comum é que isto vem acontecendo em função de que as pessoas “não estão dispostas a se comprometerem”. Essas falas apontam para um dos paradoxos que vivemos neste período que os sociólogos e cientistas sociais denominam “pós-modernidade”.
Realmente é paradoxal o fato de que as pessoas buscam construir relações, porém sem precisarem se comprometer. Há uma ambivalência, que estrutura o campo da impossibilidade: onde não há envolvimento, não há construção.
Não é novidade alguma que estamos vivendo tempos de excessivo consumismo: há uma constante e permanente busca por objetos que tragam prazer ilimitado e anulem sentimentos de solidão e desamparo. Conseqüentemente, o que observamos é que também as relações afetivas se tornaram objetos de consumo. Não há a busca pelo encontro com o outro, com a alteridade, mas a busca por um objeto amoroso destinado única e exclusivamente à satisfação das necessidades afetivas individuais. Então, na medida em que este outro é alguém que também tem desejos e necessidades próprias e que também está em busca de satisfazê-las, o que se vivencia nos encontros afetivos atuais é um grande desencontro. Um desencontro entre desejo e realidade que impede a construção de possibilidades de relacionamento a dois.
Quando ouvimos, na nossa clínica, queixas relacionadas à conflitos afetivos, sempre nos deparamos com uma mesma posição: as pessoas estão sempre prontas a apontar no que o outro foi faltante e muito pouco disponíveis a refletir sobre a sua responsabilidade e suas atitudes nesta relação. Há sempre uma busca em transformar o outro naquele objeto idealizado, ainda que disfarçada sob o desejo altruísta de “querer o melhor”.
Muitas vezes podemos observar relações que são mantidas através de um vínculo perverso, agressivo e hostil, onde o único desejo que parece unir o casal é o desejo de destituir o outro de sua auto-estima e capacidade de realização pessoal.
Relacionar-se implica em estabelecer uma relação de cuidados e o que percebemos é que as pessoas querem ser cuidadas... Mas não querem cuidar.
Cuidar não significa “ser responsável por”, mas ter consideração. Considerar o outro nas suas necessidades, nas suas diferenças, nos seus desejos.
Toda relação envolve uma certa quantidade de frustração, mas devemos avaliar se aquilo que chamamos de frustração na relação não esconde, na verdade, uma falta de comprometimento e de responsabilização pessoal pela própria existência...

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Individualidade versus Personalidades narcísicas

A individualidade é algo real e crescente na atualidade. Pode ser definida como a liberdade e a afirmação do indivíduo diante da coletividade. Em tempos anteriores, as pessoas eram submetidas à valores e normas que ditavam a vida em sociedade. As condições às quais eram submetidas, na maioria das vezes, não coincidiam com seus anseios e projetos de vida. As escolhas eram ditadas pela família ou pelas instituições às quais o indivíduo estava vinculado.
Progressivamente, foi-se vendo a conquista da liberdade. Hoje o homem é norteado por sua razão e vontade, e, sem dúvida, esse é um marco e uma grande aquisição de nossa sociedade.
Se por um lado as conquistas do homem contribuíram para uma maior autonomia e liberdade, temos que analisar outros aspectos que podem ser desencadeados pelo individualismo.
A busca pela realização dos desejos tem contribuído cada vez mais para que posturas individualistas acabem ocorrendo de formas extremadas. Ao privilegiar as vontades particulares, acaba-se deixando de lado os interesses coletivos e a evolução humana acaba ficando estancada, ou até mesmo retrocede. Para defender seu espaço, o indivíduo acaba passando por cima do outro. Desde que eu não seja prejudicado, não importa o que aconteça com o outro. Vemos com isso uma crescente falta de empatia, um egoísmo exagerado, uma insensibilidade e uma intolerância evidente. Perde-se a capacidade de se construir em conjunto e como resultado temos pessoas cada vez mais isoladas em seus ‘mundinhos’.
Essa condição atual pode ser verificada na clínica psicológica, ao nos depararmos com indivíduos com personalidades narcísicas. Essas pessoas são caracterizadas por um padrão invasivo de grandiosidade e necessidade de admiração. Em geral são pessoas que superestimam suas capacidades e exageram suas realizações e subestimam a capacidade dos demais, freqüentemente parecendo presunçosos ou arrogantes. São pessoas com fantasias de sucesso ilimitado, poder, inteligência, beleza ou amor ideal. Geralmente exigem admiração excessiva. Os indivíduos com personalidade narcisista em geral carecem de empatia e têm dificuldade em reconhecer os desejos, experiências subjetivas e sentimentos dos outros. Estes indivíduos freqüentemente desprezam e se impacientam com outras pessoas que falam de seus próprios problemas e preocupações. Quando reconhecem as necessidades, desejos ou sentimentos alheios, tendem a vê-los como sinais de fraqueza ou vulnerabilidade.
Entretanto, atrás de um comportamento auto-suficiente, observa-se que sua auto-estima é, quase que invariavelmente, muito frágil. Eles podem preocupar-se com o modo como estão se saindo e no quanto são considerados pelos outros. Isto freqüentemente assume a forma de uma necessidade de constante atenção e admiração.
Diante desses apontamentos, pode-se pensar ainda na grande dificuldade existente nesses indivíduos para se vincularem e construírem relações sólidas de confiança e amor, uma vez que se consideram auto-suficientes e, por isso, não precisam das demais.
Sem dúvida é um quadro de difícil tratamento na medida em que a vinculação é comprometida e verificam-se com freqüência as atuações. Mas nem por isso, impossível de se trabalhar em análise, desde que se atente para as questões transferenciais e contra-transferenciais.
Muito embora o Transtorno de Personalidade Narcísica atinja menos de 1% da população geral, vale fazermos uma pausa para pensarmos na forma como temos conduzido nossas vidas. Se não temos colocado nossas individualidades tão em primeiro plano, ao ponto de nos esquecermos da riqueza em poder compartilhar com o outro nossos desejos, nossas conquistas, nossas angústias. Não podemos nos esquecer de que é a partir das relações que nos construímos e não há nada que substitua essa riquíssima experiência em nossas vidas.
Ana Angélica e Valdeli

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Sobre a função paterna

O Dia dos Pais se aproxima, e não podíamos deixar de comentar sobre a importância que estes têm na formação das crianças e adolescentes.
Durante muito tempo, no ambiente doméstico, a responsabilidade da educação dos filhos era somente das mães. Ao pai, cabia o papel de provedor. Com a necessidade da inserção da mulher no mercado de trabalho, somado ao crescente número de divórcios, passou-se a dar maior atenção ao papel da figura paterna, como de importância ímpar na educação. No entanto, o que observamos é que muitas vezes esta mudança não se faz de forma tranqüila.
O papel de maior participação na educação dos filhos é um papel relativamente novo a ser desempenhado por alguns pais, e por isso mesmo, ainda gera alguns desconfortos, na medida em que muitos desses pais tiveram como modelos pais ausentes ou autoritários. Então, descolar-se deste modelo e criar uma nova forma de ser implica em deparar-se com situações geradoras de angústias e ansiedades.
Algumas vezes, na ânsia de resolver essas questões, alguns pais tentam comportar-se como extensões da figura materna, o que causa uma maior dificuldade no contato com os filhos.
Não obstante, muitas vezes mães têm dificuldades em delegar os cuidados do filho ao pai. Um dos argumentos mais utilizados por essas mães é que “o pai não cuidará do filho como ela cuida”, indicando uma desconfiança quanto à capacidade paterna de cuidar e educar. Diante disso, algumas vezes nos deparamos com situações onde a educação transforma-se em um verdadeiro campo de batalhas onde se travam enormes disputas que causam grandes prejuízos às crianças.
Inegavelmente mães e pais são diferentes, porque homens e mulheres se constituem de forma diferenciada. A questão é que é de fundamental importância que as crianças possam entrar em contato com essas diferenças, pois elas promovem o crescimento, a discriminação e a constituição da identidade.
O pai, com sua forma de ver o mundo, algumas vezes com mais racionalidade e pragmatismo, permite o desenvolvimento de habilidades sociais importantes, além de impor um limite entre mãe/filho de primordial importância na constituição psíquica das crianças. Muitas vezes é através do relacionamento com o pai que a criança adquire maior confiança em si mesma, porque muitas vezes são os pais que as colocam diante de situações desafiadoras, ao contrário das mães, que muitas vezes tentam proteger os filhos destas mesmas situações. É com o pai muitas vezes que a criança aprende a administrar sua agressividade e a desempenhar um papel mais ativo nas experiências que vive com o Outro.
É ilusório acreditar que a mãe pode suplementar o pai ou vice-versa. Cada um tem um papel importante e bem definido na educação, e o papel do pai é tão importante quanto o papel da mãe. Sem dúvida que isso não significa que cada um deve educar como entende que é o correto. Pai e mãe devem estar alinhados no que consideram educar, deve haver uma concordância nos valores e princípios a serem transmitidos, do contrário a educação torna-se caótica. Nesse sentido, o estabelecimento de uma comunicação de qualidade entre os progenitores é essencial.
Educar filhos não é uma competição sobre quem é o melhor, o mais bonzinho, o mais legal. Também não pode ser o lugar em que se disputa o amor filial, nem o campo para se resolver conflitos com as figuras parentais da geração precedente, nem é um campo de auto-afirmação. Educar é formar indivíduos e essa tarefa exige uma grande dose de tolerância, paciência e capacidade de administração de diferenças, e por isso mesmo, quando é compartilhada, torna-se mais suave para todos. Além do mais, crianças tendem a repetir o que vivenciam em suas casas: se são criadas em clima de respeito, tolerância e cumplicidade, certamente se tornarão adultos mais capacitados a administrar as questões relativas aos relacionamentos humanos que a vida lhes impuser.
Valdeli e Ana Angélica

terça-feira, 27 de julho de 2010

Algumas considerações sobre o projeto de lei contra a proibição de castigos corporais à criança

Na semana passada a mídia publicou matérias e resultados de pesquisas que avaliam o projeto de lei que prevê punição aos pais que se utilizarem de castigos físicos para educar os seus filhos. Este se tornou um assunto polêmico, que tem levantado discussões na sociedade sobre a educação das crianças, com posicionamentos inflamados de quem defende uma ou outra posição.
Sem dúvida alguma, o projeto surge como uma tentativa de coibir abusos, na medida em que é do conhecimento de todos que muitas vezes crianças são violentamente espancadas sob a justificativa de que estão sendo educadas. Os que são contrários à “lei da palmada”, como ficou conhecido popularmente esse projeto, argumentam que “as pessoas sabem diferenciar palmadas de espancamentos, que o Estado não tem o direito de se envolver na vida privada das pessoas e que algumas palmadas não traumatizam ninguém”.
Não é nosso desejo levantar novas polêmicas, mas levantar questões para que as pessoas possam refletir de forma mais aprofundada sobre este assunto.
Não faz muito tempo que a criança passou ser vista na nossa sociedade como um ser humano que têm direitos e necessidades. Até 50, 60 anos atrás (e até menos, em algumas sociedades) à criança só cabia obedecer ao que seus pais e educadores determinavam. A educação se fazia pelo medo. As crianças não obedeciam porque entendiam a necessidade de se comportarem desta ou daquela forma, mas porque temiam os castigos que surgiriam se assim o fizessem. Foi somente na década de 60 que a criança passou a ser valorizada na sociedade, muito como conseqüência da disseminação dos estudos nas áreas da Psicologia e Pedagogia. O Estatuto da Criança e do Adolescente, por exemplo, tem somente 18 anos. Isso significa que até então a criança era vista como um objeto dos pais, uma posse destes, e que, portanto, poderia ser manejada em função dos desejos dos pais. É essa idéia que está por trás do argumento de que “os pais podem fazer o que entendem que é mais adequado para a educação das crianças e que o Estado não deve interferir na vida doméstica das famílias”. Sem dúvida alguma, o Estado não deve legislar a vida doméstica. O que ele está tentando fazer é proteger as crianças.
Os pais que defendem o uso das “palmadas” justificam-nas afirmando que eles mesmos já “levaram palmadas” e que entendem, por isso mesmo, que elas não são traumáticas. Uma justificativa que revela um mecanismo de defesa chamado, em Psicanálise, de “identificação com o agressor”: a violência da qual a pessoa foi vítima deixa marcas não elaboradas que fazem com que a pessoa reproduza a situação vivida – o agredido faz-se agressor. Isso, por si, não revelaria a presença do traumático?
A noção de traumatismo em Psicanálise, se refere a um “acontecimento na vida do sujeito que se define pela sua intensidade, pela incapacidade em que se encontra o sujeito de reagir a ele de forma adequada, pelo transtorno e pelos efeitos patogênicos duradouros que provoca na organização psíquica” (Laplanche J. Vocabulário de Psicanálise, São Paulo: Martins Fontes, 1992). Sendo assim, traumático não é somente o que gera graves transtornos, mas aquilo que não pode ser elaborado. Pessoas que entendem que a força e a violência usadas contra uma criança são legitimas, revelam a presença de aspectos não elaborados de sua própria agressividade. Pais que foram criados em um ambiente saudável, continente, acolhedor, ou pais que mesmo tendo vivenciado experiências emocionais similares, conseguiram elaborá-las, não defendem o uso de tal violência.
A violência usada na educação doméstica revela a falência da educação.
O limite é fundamental na educação e a criança pede das mais diferentes formas esses limites, porque o limite delimita, traz segurança, conforta. A questão é que muitas vezes os pais não sabem lidar com limites, não tem coerência na forma com que educam os filhos, o que acaba por gerar crianças autoritárias, agressivas, rebeldes, violentas. Sendo assim, em situações de conflitos estabelece-se o caos familiar, onde a violência gera violência em um ciclo interminável...
A violência é sempre um ato disruptivo e destrutivo: destrói-se a capacidade de comunicação e contato, é uma expressão de raiva de alguém mais forte contra alguém mais frágil e indefeso. Seja uma “palmadinha”, ou uma surra, sempre é um ato violento, em maior ou menor grau, e a violência não tem justificativa.
Algumas pessoas argumentam que existem graus de violência e que devemos ser tolerantes aos graus mais leves desta. Esse argumento parece indicar a direção incoerente em que muitas vezes nossos valores caminham, a saber, a direção de nossos interesses pessoais: à violência que atende aos meus interesses eu sou tolerante, mas não àquela que não atende. Parece-nos ser esta a mesma justificativa usada por aqueles que se utilizam da violência para impor uma determinada ideologia, sistema de governo, religião...
Entendemos que esse projeto de lei pode ser o disparador de uma evolução na educação, na medida em que provoca discussões e reflexões na sociedade, e não o vemos como uma intromissão indevida do Estado. É pouco provável que ele por si só gere mudanças na forma com que alguns pais educam seus filhos. Mas de alguma forma ele chama a atenção dos pais para o fato de que sua função é proteger e cuidar dos seus filhos, e não agredi-los.

domingo, 11 de julho de 2010

É possível?

Em saúde mental, uma discussão tem sido crescente: a inserção do portador de transtorno mental no mercado de trabalho. Sem dúvida essa é uma discussão muito recente e até a bem pouco tempo inimaginável.
Se recorrermos à história, veremos que o doente mental ao longo do tempo ocupou o lugar daquele que era considerado perigoso, que causava riscos à sociedade, por isso, precisava ser isolado para não gerar problemas. Outras concepções colocavam o portador de transtorno mental no lugar do que era possuído por demônios ou eram bruxos e, também por esses motivos, precisava ser separado socialmente. Dessa forma, vemos que durante séculos, esses indivíduos eram excluídos do convívio social, sendo tratados de forma desumana em instituições ou asilos que não tratavam, pelo contrário, acorrentavam, puniam. Philippe Pinel, diretor do hospital de Salpêtrière, foi um dos primeiros a libertar os pacientes dos manicômios das correntes. Nesse momento, iniciou o pensamento de se tratar esses indivíduos ao invés de punir, por se compreender que tratava de uma doença e não de bruxaria ou possessão demoníaca.
Se pensarmos que o tratamento é algo recente no que se refere à doença mental, a discussão com relação ao trabalho do portador com transtorno mental, é ainda mais atual e tem muito a se pensar. Entretanto, pode-se observar que já existem iniciativas nesse sentido, mostrando que é possível que isso se torne realidade.
Atualmente o Ministério da Saúde tem conhecimento de 156 iniciativas de geração de renda e trabalho de usuários de saúde mental. A maioria delas nasceu dentro dos serviços de saúde mental como nos CAPS (Centros de Atenção Psicossocial), ambulatórios, residências terapêuticas, centros de convivência, como parte das ações de reabilitação psicossocial de seus usuários. As chamadas oficinas terapêuticas estão inseridas neste campo e têm servido como espaços de fomento às discussões sobre inserção no mercado de trabalho e na vida em comunidade.
As marcas da exclusão desde os primórdios do isolamento e dos maltratos do doente mental, ainda têm reflexos nos dias de hoje. Essas marcas não são percebidas apenas na sociedade em geral como para o próprio portador de transtorno mental. Este sofre enormemente com a exclusão e com idéia de que é incapaz. Esta idéia leva, conseqüentemente, a necessidade de tutela e proteção.
As iniciativas que visam gerar trabalho para essa população devem ser amparadas e valorizadas. O apoio, a capacitação e o financiamento são palavras chaves para o desenvolvimento das organizações formadas pelos usuários da rede de saúde mental. Dessa forma, pode-se contribuir para a geração de renda, para a reinserção social e, principalmente, para a melhora da auto-estima do portador de transtorno mental, que deixa de ocupar o lugar de incapaz para aquele que pode contribuir para uma sociedade mais justa e solidária.
Valdeli e Ana Angélica

quinta-feira, 24 de junho de 2010

IV Conferência Nacional de Saúde Mental

Acontece em Brasília a partir desse domingo, a IV Conferência Nacional de Saúde Mental. Tem início no dia 27 de junho e vai até 1º de julho. A conferência nacional foi antecedida por etapas municipais e/ou regionais e etapas estaduais em todo o Brasil.
Os participantes serão divididos entre 1200 delegados (com direito a voz e voto), observadores (10% da delegação de cada Estado, sem direito a voz e voto) e convidados (palestrantes, painelistas, representantes nacionais e internacionais indicados pela comissão organizadora com direito a voz).
A última conferência nacional aconteceu ao final do ano de 2001, em Brasília. Esta conferência - a III Conferência Nacional de Saúde Mental - aconteceu logo após a promulgação da Lei Paulo Delgado, Lei 10.216. A Lei Federal redireciona a assistência em saúde mental, privilegiando o oferecimento de tratamento em serviços de base comunitária, dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais, mas não institui mecanismos claros para a progressiva extinção dos manicômios. Ainda assim, a promulgação da lei 10.216 impõe novo impulso e novo ritmo para o processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil. É no contexto da promulgação da lei 10.216 e da realização da III Conferência Nacional de Saúde Mental, que a política de saúde mental do governo federal, alinhada com as diretrizes da Reforma Psiquiátrica, passa a consolidar-se, ganhando maior sustentação e visibilidade.
A III Conferência consolida a Reforma Psiquiátrica como política de governo, confere aos CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) o valor estratégico para a mudança do modelo de assistência, defende a construção de uma política de saúde mental para os usuários de álcool e outras drogas, e estabelece o controle social como a garantia do avanço da Reforma Psiquiátrica no Brasil. É a III Conferência Nacional de Saúde Mental, com ampla participação dos movimentos sociais, de usuários e de seus familiares, que fornece os substratos políticos e teóricos para a política de saúde mental no Brasil hoje.
Mas ainda há muito que se discutir. A IV Conferência Nacional de Saúde Mental tem entre os objetivos a promoção do debate da saúde mental com os diversos setores da sociedade no atual cenário da Reforma Psiquiátrica, que indica novos desafios para a melhoria do cuidado em saúde mental no território, devendo contemplar o desenvolvimento de ações intersetoriais.
Para mais informações ou dúvidas sobre a IV Conferência Nacional de Saúde Mental – Intersetorial entre em contato no endereço: ivconferencia.ms@saude.gov.br
Ana Angélica e Valdeli

terça-feira, 15 de junho de 2010

CAPITALISMO EM TEMPOS MODERNOS

As notícias que têm sido publicadas na mídia a respeito da empresa multinacional taiuanesa Foxconn certamente nos chama a atenção e nos faz refletir em alguns aspectos.
Segundo noticiários, a maior empresa chinesa fabricante de aparelhos como o iPad e o iPhone foi surpreendida nas últimas semanas com o suicídio de alguns funcionários, e anunciou que deixará de pagar compensações aos familiares de trabalhadores que se matarem. Isso porque segundo a empresa, os funcionários cometeram o suicídio para que suas famílias recebessem uma indenização.
A empresa justifica dizendo que a maioria dos familiares de empregados que se suicidaram receberia, uma indenização de 100 mil iuenes (cerca de US$ 14,6 mil) e os suicidas eram quase todos jovens recém chegados à firma que provinham de zonas rurais e pobres da China, alguns deles com problemas emocionais como desilusões amorosas ou tristeza por ter deixado sua localidade natal.
Em outras reportagens, entretanto, tem-se apontado que os suicídios dos funcionários ocorreram na mesma época em que protótipos do iPhone teriam vazado da empresa, o que poderia cooperar para o contrabando de produtos falsificados. Nesse sentido, tem-se discutido uma possível relação entre o suicídio dos funcionários e o mercado das falsificações na China. Concomitantemente, outras notícias revelam que os mesmos funcionários eram submetidos a uma carga de trabalho exasperante e salários irrisórios. Segundo um repórter do Suthen Weekly os empregados da empresa chegam a trabalhar 12 hs por dia, praticamente sem períodos se descanso, com um salário na casa dos US$ 130 (cerca de R$240).
Talvez não se chegue a uma conclusão precisa quanto a real causa que levou estes funcionários a tirarem suas vidas. Mas de qualquer forma o fato nos faz pensar em como tem sido a postura das empresas com seus funcionários em tempos de capitalismo e à que situações as pessoas acabam se submetendo em nome de terem um trabalho.
Seja qual for a causa das mortes, o que se nota é que a empresa tem se implicado muito pouco no processo de esclarecimento das mortes, usando diversas justificativas para não assumirem responsabilidades e encargos com seus funcionários, não se implicando nos cuidados com a saúde do trabalhador. Não se questiona se a carga de trabalho é excessiva, se o funcionário está satisfeito com o trabalho, se a remuneração recebida é condizente com a tarefa executada, se existem problemas emocionais ocorrendo com o funcionário, não, nada disso. A justificativa que a empresa utiliza é de que o funcionário tirou sua vida para deixar dinheiro para sua família. Dessa forma se exime de qualquer responsabilidade que possa ter. Ou mesmo se pensarmos que as mortes podem estar relacionadas ao fato da tecnologia ter vazado da empresa através de algum funcionário, seria ainda mais escabroso.
Pensar que alguém é capaz de tirar sua própria vida em nome de que sua família receba indenizações é algo um tanto quanto peculiar de se imaginar. O suicídio implica um enorme sofrimento emocional, significa que o sujeito não consegue pensar em outra alternativa para sua vida senão em tirá-la, uma vez que está submetido à angústias e problemas diante das quais não consegue ver solução. Um indivíduo que se encontra com a saúde mental preservada não vê o suicídio como alternativa para uma situação, mesmo diante de circunstâncias de grande conflito.
Sendo assim, é importante nos questionarmos sobre o lugar que temos ocupado em nossos trabalhos atualmente e se não estamos nos submetendo à condições que nos lembram velhas situações de escravidão, ou mesmo nos submetendo à posições que podem desencadear processos psicopatológicos e grande sofrimento e que coloquem em risco nossa integridade física. Precisamos ter em mente que o trabalho deve ser fonte de prazer, satisfação e crescimento pessoal. Por isso, cabe fazer uma pausa, nos questionar como tem sido o trabalho na vida de cada um de nós e se talvez não seja hora de mudar.
Valdeli e Ana Angélica

sábado, 5 de junho de 2010

A importância do limite na formação das crianças

Tem sido comum nos últimos anos, que pais aflitos procurem psicólogos para tentarem entender suas crianças que, segundo eles próprios dizem, “saíram do controle”. Ao mesmo tempo, é crescente a constatação de professores e orientadores escolares que os pais não estão conseguindo controlar seus filhos. Alguns pais nos dizem que “as crianças de hoje não obedecem mais, não aceitam limites”, relatando situações de conflitos com os seus filhos onde sentem-se absolutamente impotentes no manejo destas situações.
Mas será que as crianças mudaram?
Certamente hoje as crianças têm mais acesso a informações, estão mais questionadoras e sentem-se mais seguras para fazer os seus enfrentamentos. No entanto, existe uma questão importante: essa criança não está se formando sozinha, está inserida em um núcleo familiar cujas intra-relações colaboram para a sua formação e lhes servem como modelo. E isso muitas vezes, é esquecido pelos pais, e à criança é depositada toda a responsabilidade por seus atos e atitudes.
Por volta dos anos 70, 80, o modelo de educação familiar e escolar até então vigente passou a ser profundamente questionado, e as novas teorias psicológicas e orientações pedagógicas traziam como fundamental a necessidade de um olhar qualitativamente diferente sobre a criança, olhar esse que valorizasse suas necessidades e seu processo de desenvolvimento individual. Os vínculos entre pais e filhos e mesmo entre professores e alunos se alteraram, com uma maior proximidade e o estabelecimento de francos diálogos. No entanto, parece ter havido alguns equívocos nesse processo e um deles, foi a confusão que se criou entre o significado de “limite” e “repressão”. Nesse sentido, essas palavras passaram a ser tratadas como sinônimos, e uma vez que estas novas correntes de saber questionavam a repressão, o limite também passou a ser questionado na educação das crianças. Conseqüentemente, excessos passaram a ser cometidos, e o limite, pedra angular na formação das crianças passou a não ser mais claramente estabelecido. O resultado é o caos que ultimamente observamos nas relações entre pais e filhos.
O estabelecimento de limites é fundamental para a formação da criança em indivíduo autônomo e inserido na sociedade, uma vez que ele permite que a criança discrimine suas competências, se adéqüe às regras sociais e se desenvolva integralmente. A ausência ou a fragilidade dos limites podem gerar perturbações como:
- dificuldade em desenvolver a capacidade de juízo e crítica;
- dificuldade no estabelecimento dos processos mentais que permitem a aprendizagem;
- desorganização do pensamento;
- intolerância à frustração;
- impulsividade que pode colocar em risco sua integridade física e psíquica;
- instabilidade emocional que pode favorecer o estabelecimento de quadros psicopatológicos;
- inadequação à ambientes de convívio social.
Colocar limites é trabalhoso, e não se consegue fazê-lo de forma violenta, mas é uma construção diária nas relações. Além do mais, construir esses espaços de discriminação nos leva também a ter que lidar com a nossa própria forma de estabelecer nossos limites, e é aí que muitas vezes os pais se perdem.
A informação também é um componente importante nesse processo, existindo uma literatura disponível para instrumentalizar os pais nessa tarefa. Sugerimos o excelente livro de Rosely Sayão, “Como educar meu filho?”, porém lembramos que não existe manual de instrução. Cada família e cada criança têm sua individualidade que precisa ser percebida e compreendida, portanto livros são instrumentos auxiliares.
Consultar um psicólogo também pode ser bastante valioso, uma vez que este profissional pode identificar áreas de conflito e colaborar em um processo de reorganização familiar.
Valdeli e Ana Angélica

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Ética na mídia: considerações sobre crítica à matéria publicada na Folha de São Paulo

Como profissionais de saúde mental, procuramos nos manter constantemente atualizadas sobre matérias publicadas na mídia que de forma direta ou indireta, enfoquem questões referentes ao relacionamento humano, à saúde mental e qualidade de vida. Sendo assim, temos por hábito acompanhar as matérias publicadas no caderno do jornal Folha de São Paulo destinado ao público jovem, o Folhateen, na medida em que este é um dos públicos-alvo dos nossos atendimentos.
Qual não foi nossa surpresa ao encontrarmos, no dia 17/05/2010, na coluna “Internets” do referido caderno, matéria publicada pelo Sr Ronaldo Lemos que era um claro incentivo à pirataria. Na referida coluna este Sr fazia uma crítica ao fato de que proprietários do iPhone não conseguiam baixar diretamente da Apple jogos e aplicativos na medida em que a empresa não se submetia à lei de classificação indicativa de jogos e sugeria uma solução para o problema em questão (transcrição literal): “se no cadastro da loja da Apple você se identificar como argentino, um mundo imenso de jogos e outros aplicativos não disponíveis vai se abrir. A única exigência é que o candidato a 'hermano' coloque um CEP da Argentina (meu amigo recomenda o uso do CEP da Associação de Futebol Argentino, que é C1053ACB)”.
Ou seja, o referido colunista não só incentivava a transgressão como ensinava os passos para fazê-la! E mais, o senhor em questão tem formação em Direito!
Estamos vivendo tempos onde os valores éticos e de respeito à sociedade estão sendo constantemente atacados em detrimento de valores individuais, e embora fiquemos perplexos e indignados quando tomamos contato com situações como essa, nossa tendência geralmente é reclamar junto àqueles com quem convivemos, criticar a omissão da sociedade e... Calamos-nos. Porém resolvemos tomar uma atitude.
Escrevemos uma crítica ao colunista com cópia para a redação do caderno e ao ombudsman do jornal. O colunista, como era esperado, tentou minimizar sua atitude, colocando que estava somente “citando um fato de forma bem humorada”, porém a ombudsman, Sra. Suzana Singer acabou por reconhecer e concordar com nossa crítica, respondendo que “concordava com a nossa opinião sobre a coluna, uma vez que ela dava os passos para a pirataria”.
Não sabemos os desdobramentos que este fato terá, isso se tiver algum desdobramento. Não importa. O que realmente importa é que nos posicionamos como cidadãs e profissionais diante de pessoas que deveriam ser comprometidos com a ética, porém muitas vezes não o são. Gostaríamos sinceramente que este senhor se retratasse na sua próxima coluna, muito embora tememos que suas palavras tenham influenciado negativamente algumas das centenas de jovens leitores desse caderno.
Resolvemos postar aqui esse fato não para alimentarmos algum sentimento de vaidade, mas sim para dizer a vocês que muitas vezes nos omitimos diante de determinadas situações por acreditarmos que sozinhos não conseguimos nada. Isso não é verdade. Sozinhos, podemos fazer sim um trabalho que pode crescer, se multiplicar e efetivamente colaborar para pequenas transformações em nossa sociedade. Cada um de nós é um agente de transformação social, embora na maioria do tempo nos esquecemos disso...
Valdeli e Ana Angélica

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Depressão pós-parto masculina

Não houve erro de digitação, o que você leu é verdade: existe depressão pós-parto masculina, e embora desconhecida, costuma atingir um em cada dez homens no período entre o início da gestação da mulher até o bebê completar um ano. Estes dados acabam de ser publicados no "Jama", periódico da Associação Médica Americana consistindo em uma revisão de 43 estudos com 28 mil participantes. Nos Estados Unidos, a taxa de prevalência é de 14%, porém no Brasil ainda não temos estudos concluídos que nos parmitam uma comparação adequada. O estudo aponta também a existência de correlação entre a depressão pós-parto masculina e a depressão pós-parto feminina.
Entre os vários fatores que podem funcionar como desencadeador desses casos podemos destacar:
- insegurança do pai em relação aos cuidados com o bebê
- insatisfação pela dificuldade em ter uma participação mais ativa nos cuidados com o mesmo
- insatisfação relacionada à vida sexual do casal nesse período
- dificuldades em se adaptar à nova situação
- dificuldades em identificar e compreender as novas necessidades de cuidados e afetos da mãe
- dificuldades em se adaptar às instabilidades de humor da mãe nesse período
- sentimentos de exclusão na relação mãe-bebê
- situação econômica familiar após o nascimento da criança.
A identificação do quadro pode se dar através da observação do comportamento do pai, principalmente se este manifesta sentimentos de competitividade com o bebê (ou se o ignora), se começa a passar mais tempo fora de casa e se tem comportamentos no sentido de afastar a mãe do bebê.
O auxílio terapêutico é o mais indicado em casos leves, porém em pacientes que já apresentem um agravamento do quadro, o acompanhamento médico é imprescindível.
É necessário atenção a este quadro, uma vez que dificuldades emocionais em um ou ambos os pais, certamente terão um impacto no cuidado com a criança, podendo gerar dificuldades também nesse período inicial de desenvolvimento emocional.
Valdeli e Ana Angélica

terça-feira, 11 de maio de 2010

O parceiro ideal

Quem nunca se imaginou com o parceiro perfeito ao seu lado? Certamente tudo mundo já pensou. Mas e o que seria o parceiro ideal? Seria aquela pessoa que realizaria todos os nossos desejos? Ou seria aquela pessoa que mesmo naquele dia em que estivéssemos nos sentindo a pior pessoa do mundo, estaria ao nosso lado para nos encher de elogios e nos colocar lá em cima? Também poderia ser aquela pessoa com quem dividiríamos todos os nossos sonhos, compartilharíamos todas as nossas angústias, nossas incertezas, e ainda assim ali estaria ela, presente, firme ao nosso lado. E claro, seria o mais maravilhoso dos seres, porque perfeito e ideal também inclui ter uma aparência sem defeitos. Mas será que essa perfeição existe? O parceiro ideal existe? Eis a questão.
Vemos hoje que as pessoas possuem múltiplas maneiras de se relacionarem e conhecerem pessoas novas. Ninguém mais se vê preso a relacionamentos que não têm o que acrescentar por simples comodismo ou por questões sociais. Só se fica ao lado de alguém, quando esse outro tem algo muito bom para adicionar, acumular; diminuir jamais. Caso contrário, o melhor é terminar o quanto antes, para não se perder tempo. Pois o tempo de todo mundo hoje é muito precioso, todo mundo está correndo o tempo inteiro, querendo aproveitar cada instante da vida, nada pode escapar.
Os adolescentes têm o “ficar”. Vão às baladas, beijam um, dois, três, quatro. Quanto mais, melhor. O legal é poder experimentar o quanto puderem. Já os adultos podem ter os “relacionamentos abertos”. Tem-se o relacionamento com uma pessoa, mas sem compromisso. Cada um leva sua vida de forma independente e, se surgir alguém interessante, pode-se relacionar com o terceiro também. O que se considera interessante é o não se vincular, é não precisar se envolver e se responsabilizar pelo relacionamento.
Mas o que podemos notar, mesmo com a moda do ficar e dos relacionamentos abertos, é que todo mundo continua desejando ter um parceiro perfeito ao lado. E porque será tão difícil encontrar esse parceiro perfeito? Talvez seja pelo fato dele simplesmente não existir. Não existe ninguém perfeito. Existem pessoas com as quais podemos ter uma identificação maior, que combinem mais com a gente e isso pode ajudar na construção de um relacionamento. Mas não significa que esse parceiro não tenha inúmeros defeitos assim como nós mesmos. E nem o fato de encontrarmos alguém que seja um pouco mais parecido com a gente, significará que será fácil se relacionar com essa pessoa.
Relacionar-se significa estar aberto para conhecer um Outro e saber que mesmo tendo coisas em comum, existem as diferenças, características de cada que terão que ser respeitadas, porque cada um possui a sua individualidade. Significa construir uma relação que não nos é dada como pronta. Sendo assim, exige tolerância, cuidado e, claro, muito amor e dedicação. E para se conseguir isso, temos que nos dedicar antes de tudo a nos conhecermos, nos constituirmos como pessoas, inteiras, para depois pensarmos em compartilhar a vida com outra pessoa.
Poder conhecer muita gente e se relacionar com outras tantas pode ser muito interessante, mas muito gostoso também é poder conhecer a mesma pessoa todos os dias, ver o que ela tem de novo e o que ainda não se conhecia até então. Isso significa sermos maduros e estarmos realmente preparados para encontrarmos o parceiro ideal, não porque se encontrará a perfeição, mas porque já se estará suficientemente amadurecido para saber que cada um é um, com suas qualidades e defeitos, mas ainda assim poder se construir uma relação e uma vida a dois.

Ana Angélica e Valdeli

terça-feira, 4 de maio de 2010

Mensagens pela internet à pacientes com câncer

O Instituto Mario Penna, em Belo Horizonte instituiu uma projeto inovador para os pacientes internados em tratamento contra o câncer.
A campanha, denominada "Doe Palavras", permite que os pacientes recebam mensagens pela internet de amigos ou anônimos, sendo estas mensagens reproduzidas nas 12 TVs instaladas nas unidades de quimioterapia, radioterapia e sala de espera do hospital. A ideia do projeto é criar um banco de frases que possam transmitir conforto e esperança aos pacientes e familiares, e por isso mesmo, as frases passam por uma triagem para que se evitem piadas ou frases desagradáveis.
Segundo o diretor do hospital Cassio Eduardo Rosa Resende, "o paciente se sente envolvido por uma corrente virtual que se torna real".
As mensagens ficam nos televisores por 24hs e também podem ser lidas no site da campanha. No final do ano as melhores serão compiladas em um livro a ser distribuido para os hospitais especializados em tratamento de câncer.
Se você também quiser participar dessa corrente virtual do bem, envie sua mensagem para www.doepalavras.com.br.
Ana Angelica e Valdeli

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Um certo mal-estar contemporâneo...

Os últimos 20 anos têm sido surpreendentes para a humanidade. O avanço tecnológico, em todas as áreas do conhecimento humano vem possibilitando aos indivíduos uma ampla gama de escolhas até então inimagináveis, e muito têm contribuído à sociedade, uma vez que o indivíduo não se vê mais limitado a situações ou restrito a fazer escolhas que até então limitavam seus anseios.
Há bem pouco tempo, as famílias se organizavam de uma forma tradicional, as experiências emocionais de relacionamento se davam preferencialmente no ambiente doméstico e as opções no momento de escolha profissional eram restritas, muito vezes restritas aos cursos de medicina, engenharia ou direito, profissões que eram revestidas de status social. Estas escolhas se davam muitas vezes pela influência paterna, o que protegia o indivíduo das angústias relacionadas ao momento de definição profissional.
Os contatos sociais aconteciam dentro dos limites da escola e do bairro, e os relacionamentos afetivos geralmente se davam entre as pessoas mais próximas, não raro entre pessoas que se conheciam desde criança.
As possibilidades se ampliaram. Novos cursos superiores ou cursos de formação técnica surgem a cada dia. Se antes fazer um curso superior era sinônimo de emprego garantido no futuro, vemos hoje que essa formula não é tão exata. Além do mais, as facilidades para se fazer cursos no exterior são crescentes. Assim, é possível vermos hoje famílias em que cada um dos filhos se encontra em um país diferente fazendo coisas completamente diferentes.
As possibilidades de contatos sociais também cresceram. As aproximações acontecem nos mais diversos lugares – em cursos, pela internet, em viagens, podendo acontecer entre pessoas de culturas totalmente diferentes.
Enfim, as possibilidades de escolha em todos os campos – profissional, afetivo, sexual e social - romperam todos os limites.
Entretanto, paralelamente ao grande número de possibilidades, percebemos que as pessoas encontram-se angustiadas, perdidas diante de tantas possibilidades, queixando-se de confusão, sentimentos de vazio e desamparo, e não reconhecimento de suas próprias identidades. As pessoas parecem não saber o que fazer diante de tudo isso, e então se sentem paralisadas, engessadas. Como conseqüência direta, observamos o aumento da prevalência de alguns quadros psicopatológicos como os transtornos de ansiedade e a depressão.
As psicopatologias, na sua maioria, não são simples manifestações de aspectos neurofisiológicos que se apresentam de forma desorganizada, mas devemos entendê-las como resultantes da inter-relação desses aspectos biológicos, de uma estrutura de personalidade que se apresenta fragilizada, associados a interação do indivíduo com o seu meio, a partir das relações que estabelece, e da forma como se coloca no mundo.
Outro fenômeno da atualidade é o surgimento de grupos radicais, fundamentalistas, totalitários, seja no campo da religião, política ou cultura. Na maior parte das vezes seus adeptos estão entre as pessoas que vivem intensamente as angústias descritas acima e que encontram nesses grupos uma possibilidade de constituição da identidade uma vez que os limites eu/outro, interno/externo são rigidamente estabelecidos.
Podemos dizer que os tempos são modernos, as possibilidades sem fim, mas que as pessoas continuam precisando de contornos. Precisam sentir-se seguras, o que se dá à partir do reconhecimento de si mesmo como um indivíduo integrado, e isso só é possível através do enfrentamento da angústia e do desamparo, uma vez que, cada vez mais precisamos nos tornar responsáveis pela construção de nossos limites internos e de nossos paradigmas.
Ana Angélica e Valdeli

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Evento “Música e Consciência”: nós apoiamos!

A ANDA (Agência de Notícias de Direitos Animais) - www.anda.jor. br – realizará um show para sensibilizar as pessoas em relação aos direitos animais e à preservação do planeta, no próximo dia 29 de abril, no SESC Pompéia (choperia), às 21h.
Grandes nomes da música brasileira, como: Fernanda Porto, Nuno Mindelis, Palavra Cantada, Patrícia Marx, Renato Teixeira, Teatro Mágico já estão confirmados. A atriz Gabriela Duarte também estará presente para chamar a atenção sobre a necessidade de mudarmos nossas atitudes.

O concerto “ANDA – Música e Consciência – Pelos animais, pelo Planeta” pretende disseminar por meio da música e dos artistas a importância de vivermos em harmonia, respeitando a vida.

Durante o evento, o artista plástico ambiental Alexandre Huber, pintará um grande painel retratando animais marinhos (a vida nos oceanos).

Será o primeiro show no Brasil com a proposta de levar uma mensagem de convivência pacífica e ética com todos os seres. Os artistas dão um exemplo de consciência ao se reunirem para cantar e se apresentar sem cachê. Todo o evento está sendo construído com colaborações voluntárias.

As emissões de gases estufa provocadas pela realização do show "ANDA – Música e Consciência" serão neutralizadas com o plantio de árvores no Parque Ecológico do Tietê. A iniciativa é uma parceria da ANDA com o Instituto Brasileiro de Defesa da Natureza.

Mais sobre a ANDA (Informar para Transformar)
A ANDA – Agência de Notícias de Direitos Animais – foi fundada em 28 de novembro de 2008 pela jornalista Silvana Andrade e tem como seus principais objetivos difundir informações e valores que gerem consciência para defesa e garantia dos direitos animais, incentivar à reflexão sobre a necessidade de mudar a maneira como os animais são considerados na sociedade, gerar a percepção de que podemos construir um mundo de paz para todos os seres e criar ações que estimulem a convivência harmônica entre pessoas e animais.

A equipe é formada por jornalistas, filósofos, biólogos, nutricionistas, advogados, promotores públicos, professores, escritores, publicitários, entre outros profissionais que atuam voluntariamente na ONG. Atualmente são 36 colunistas, além das colunas, o site conta com mais de 300 artigos postados e entrevistas exclusivas. Cerca de 50% das notícias publicadas são produzidas pela redação da ANDA, o restante são clipadas de outros veículos. Com tão pouco tempo de existência, a ANDA já conta com cerca de 200 mil acessos únicos por mês e internautas em 65 países.

Serviço:
Anda – Música e Consciência Pelos Animais, pelo Planeta
Data: 29/04/2010
Horário: 21h
Censura livre
Local: Sesc Pompéia - Choperia - São Paulo / SP

Valdeli e Ana Angélica

terça-feira, 20 de abril de 2010

Algumas considerações sobre a pedofilia

O escândalo envolvendo a Igreja Católica em casos de pedofilia, e as recentes notícias sobre a ocorrência de novos casos a cada dia tem levantado questões e gerado algumas distorções conceituais sobre essa grave psicopatologia, o que nos levou a fazer algumas considerações.
Sem dúvida alguma o assunto é complexo e não temos a pretenção de esgotá-lo nem tampouco de discorrer tecnicamente sobre o mesmo, na medida em que este blog não se destina somente a profissionais da saúde mental, mas pretendemos fazer alguns assinalamentos que nos parecem importantes.
A pedofilia, por definição, é uma perversão sexual onde a atração e o desejo sexual de um adulto está dirigido para crianças pré-púberes. Embora a maioria dos casos relatados envolva agressores do sexo masculino, o comportamento pedófilo não é característico do sexo masculino. Na verdade, especula-se que o comportamento pedófilo em mulheres ocorre de forma mais velada, através de uma erotização do contato físico e que de alguma forma não é prontamente identificado porque o ato de cuidar, acariciar e de tocar uma criança é socialmente interpretado, em um primeiro momento, como um ato comum relacionado à maternagem. Não existe nenhuma correlação entre a pedofilia e o homossexualismo, como algumas pessoas insistem em fazer, esta é uma afirmação inconsistente e preconceituosa, na medida em que a pedofilia pode ser encontrada em homossexuais e heterossexuais.
Sua etiologia não foi plenamente estabelecida até o momento. Por algum tempo, alguns estudos levantaram a hipótese de que as pessoas que praticavam pedofilia em algum momento de suas vidas pregressas foram vítimas de abuso ou violência sexual, porém não houve até o presente momento uma comprovação científica desta relação. Alguns estudos tem sido desenvolvidos no sentido de encontrar bases biológicas para tal comportamento, mas ainda não temos resultados consistentes e satisfatórios.
Embora os sintomas sejam claros, a pedofilia muitas vezes se apresenta em um quadro misto, sendo difícil em alguns casos determinar se ela é um quadro primário ou secundário a outras formas de perversão. Muitas vezes pedófilos também apresentam quadros de sadismo ou voyeurismo, por exemplo.
Existem poucos estudos na área da saúde mental que abordem essa questão, porque tais pacientes raramente chegam aos consultórios ou serviços de saúde buscando tratamento para esta patologia. Os pedófilos geralmente só são identificados quando seus atos são criminalmente denunciados. Isso ocorre porque tais pessoas na maioria das vezes conseguem ter uma vida com adequação e adaptação nos demais setores (familiar, social, ocupacional) ficando a perversão configurada no estrito campo da vida sexual. Não é incomum, por exemplo, que a denúncia do envolvimento de um membro da família em casos de pedofilia surpreenda aos demais, uma vez que essas pessoas conseguem ter uma funcionalidade em suas vidas.
A pedofilia é crime, é uma violência que se pratica contra a criança pré-púbere, ainda que com o seu consentimento, uma vez que é uma situação onde um adulto submete e subjuga um menor imaturo psiquicamente e sexualmente aos seus desejos.
Alguns estudos no campo da psicologia social tem apontado a erotização precoce das adolescentes através da mídia como um fator favorecedor ao surgimento dessas patologias. Sem dúvida que um meio ambiente permissivo, onde os limites são muito elásticos, somado à questões econômicas (turismo sexual, prostituição infantil em populações de baixa renda, por exemplo), políticas e culturais podem ser favorecedores à atuações psicopatológicas. Porém, não podemos esquecer que estamos falando de um transtorno grave, que não pode ser minimizado.
Muitas vezes as vítimas de pedofilia silenciam sobre o que vivem por medo, até porque o agressor muitas vezes é alguém pertencente à sua rede de relacionamentos. Nesse sentido, é de fundamental importância que pais, educadores e profissionais de saúde estejam atentos à mudanças de comportamento nas crianças, uma vez que estes são os sinalizadores de situações de abuso e violência.
Valdeli e Ana Angélica

terça-feira, 13 de abril de 2010

Novo código de ética médica entra em vigor a partir de hoje

A partir da data de hoje, entra em vigor o novo código de ética aprovado pelo Conselho Federal de Medicina que legisla a prática destes profissionais. O antigo código, surgido em 1988 não abrangia situações que hoje são vivenciadas no cotidiano da prática médica.
A nova legislação tem mais de 188 novas normas, cabendo-se destacar:
- É vedado ao médico intervir no genoma humano com vista à sua modificação (manipulação genética) exceto na terapia gênica.
- A escolha do sexo do bebê é vedada em casos de reprodução assistida.
- A letra utilizada em prescrições, orientações e prontuários deve ser legível.
- O paciente pode ter acesso ao seu prontuário.
- O médico precisa pedir ao paciente o consentimento sobre procedimentos a serem realizados exceto em caso de morte iminente. Caso o paciente esteja comprometido na sua capacidade de juízo e crítica o responsável deve ser consultado.
- Os médicos deverão acatar a decisão de pacientes terminais que não quiserem dar continuidade ao tratamento, praticando somente os cuidados paliativos.
- Se o paciente quiser ouvir uma segunda opinião sobre seu diagnóstico e/ou tratamento o médico deve colaborar, não se opondo a transmitir informações à outro médico, colaborando também para a formação de uma junta médica, caso se faça necessária, para discussão do caso.
- É proibida a participação de médicos em propagandas ou vendas de medicamentos bem como ter seu nome associado a consórcios, cartões de desconto ou planos de financiamento para procedimentos médicos.
- No caso da ausência de médicos nos plantões ou centros de saúde, é responsabilidade da instituição promover o atendimento sob risco de penalização.
- Nenhum regulamento ou disposição de hospitais ou instituições médicas poderá limitar a escolha do médico dos meios cientificamente reconhecidos para tratamento, ou diagnóstico, salvo quando em benefício do paciente.
Essa nova normatização visa não só o fortalecimento e a valorização do profissional médico, mas é um avanço em relação à humanização do atendimento e ao respeito mútuo que deve existir na relação médico-paciente.
Para o acesso a toda a legislação, consulte:
www.ippmg.org.br/imageBank/codigo_etica_medica.pdf
Importante: essas novas regras valem para todo o Brasil!
Valdeli e Ana Angélica

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Sobre pais e filhos

Atualmente tem sido muito comum ouvirmos dos pais queixas de que “as crianças estão impossíveis hoje... não dá mais pra controlar os adolescentes... não existe mais respeito nos filhos...” e muitas outras que tem um mesmo núcleo em comum: a idéia de que as crianças e adolescentes do mundo contemporâneo são seres sem limites, que vivem de acordo com seus desejos e vontades, onde não se faz possível qualquer tipo de comunicação.
Colocar a responsabilidade das dificuldades de relacionamento entre pais e filhos nos mesmos, nos parece uma atitude que revela certa dose de imaturidade, o que faz, nesse caso, os pais se aproximarem dos filhos, no que se refere à capacidade de enfrentamento de problemas.
Sem dúvida alguma, o avanço tecnológico tem permitido um maior acesso à redes de informações, o que tem colaborado pra que a nova geração se mostre mais questionadora e com posições com maior sustentação argumentativa. Porém, essa mesma facilidade de acesso às informações podem deixar os adolescentes mais expostos e ter acesso à informações que não necessariamente são pertinentes ou contribuam para o seu desenvolvimento. Além disso, correntes pedagógicas que estimulam o pensamento crítico acabam por colaborar bastante para que esta geração desenvolva um pensar autônomo diferente das gerações anteriores.
Porém, essas mudanças não são as responsáveis pelos conflitos atualmente presentes nas relações pais e filhos, mas sim as profundas alterações que sofreu a família e a sociedade nos últimos anos.
A família sempre teve fundamental importância na formação dos indivíduos. É no seio da família que vivemos nossas primeiras experiências emocionais, nossos primeiros conflitos, onde são transmitidos valores individuais e coletivos, sendo assim, um laboratório para a vida em sociedade. Nesse sentido, a postura adotada pelos pais ainda que nas fases iniciais do desenvolvimento das crianças terão um profundo impacto na forma como os mesmos vão lidar com suas dificuldades em fases ulteriores do desenvolvimento.
E no que a família mudou? A família mudou no sentido de que as funções maternas e paternas estão sendo negligenciadas em relação às necessidades individuais dos progenitores.
Sem dúvida alguma, hoje a sociedade oferece inúmeras possibilidades de crescimento e satisfação de necessidades individuais e a constituição de uma família deixou de ser essencialmente o maior objetivo das pessoas. No entanto, uma vez constituída uma família, uma vez que as pessoas se tornam mães e pais, novos papeis sociais são estabelecidos e com eles novas responsabilidades que não podem – e não devem – ser negligenciadas.
Não estamos com isso defendendo a idéia de que casamentos não podem ser destituídos, que pais não devem se separar em nome dos filhos, longe disso: as pessoas devem sim fazer escolhas em suas vidas e buscarem relações que lhes sejam mais adequadas às suas necessidades afetivas. Aliás, casamentos infelizes, onde os pares se suportam, podem ser muito mais danosos à formação dos filhos. A separação do casal parental é uma experiência dolorosa, sem dúvida, mas também uma experiência de crescimento e aprendizagem para todos. Sendo assim, quando afirmamos que a família mudou, estamos nos referindo ao papel dos pais, independente do fato deles morarem juntos ou não.
Ter filhos e se responsabilizar pelas suas formações como indivíduos é trabalhoso, sem dúvida. Implica em lidar com frustrações, em saber ouvir, em desenvolver capacidade de comunicação, em lidar com o diferente e com sentimentos complexos como impotência, medo, raiva e angústia. Implica em saber falar sim, mas principalmente em saber falar os “nãos” necessários para que os filhos possam ir aos poucos constituindo seus limites e percebendo suas possibilidades. Implica muitas vezes em abrir mão das próprias necessidades de prazer e satisfação pessoal em detrimento de um Outro que precisa de cuidados.
Chama a atenção como esta tarefa tornou-se um fardo para muitos pais. Na verdade, percebe-se que hoje muitas vezes as pessoas querem ter filhos muito mais por vaidade, para se sentir igual ao outro, para constituir uma identidade, do que efetivamente para cuidar de alguém. Conseqüentemente, tais pais delegam à escola, às babás e até aos psicólogos cuidados que são de competência própria.
O que os pais não percebem é o impacto, e o custo que essa des-responsabilização trará às suas relações futuramente. Por exemplo, uma queixa marcante de pais de adolescentes diz respeito ao distanciamento dos filhos, seu isolamento em relação à família e a falta de comunicação. No entanto, ao ouvirmos esses pais no que se refere à períodos anteriores de desenvolvimento dos filhos, percebemos que inicialmente o afastamento foi deles, na medida em que desvalorizavam os conteúdos das conversas com as crianças. Frequentemente nos deparamos com pais que não têm muitos interesses pelas vidas dos filhos, a tal ponto de não terem a menor idéia de quais são seus melhores amigos, o que temem, o que planejam, o que lhes tira o sono. Porque se envolver com o outro dá trabalho... e ter trabalho é exatamente o que as pessoas estão querendo evitar!
Em outras situações até encontramos pais aparentemente envolvidos com o desenvolvimento dos filhos. Aparentemente, porque apesar de nos seus discursos se mostrarem participativos, uma escuta mais atenta aponta para uma necessidade destes em mostrarem para a sociedade suas múltiplas habilidades como pais, revelando novamente pouco comprometimento e pouca percepção das necessidades dos filhos e um comprometimento maior com seu próprio narcicisimo.
Pais são os primeiros modelos das crianças e adolescentes e eles sempre estão atentos ao que é dito e ao que é praticado. Como cobrar dos filhos que respeitem leis e ordens, se os próprios pais estão sempre encontrando uma forma de burlar as leis, parando, por exemplo, em fila dupla na porta da escola? Como cobrar interesse pela leitura, quando os pais muitas vezes são os primeiros a falar que não gostam de ler? Como se pode cobrar o respeito aos pais, quando são eles os primeiros a desrespeitarem seus filhos, seus vizinhos, o pedestre na rua? Como esperar de um filho conversas na mesa quando por tantos anos esses mesmos filhos foram afastados dos pais porque estes estavam cansados e não queriam barulho em volta?
Fica aqui então o nosso recadinho: as relações pais e filhos são constituídas em uma via de mão dupla, o que significa que pais são participantes ativos dessas relações. Não dá para olhar para os filhos e culpabilizá-los por conflitos existentes. Filhos precisam de pais, que tenham a maturidade que eles ainda não desenvolveram para lidar com situações difíceis. Filhos não precisam de pais que se comportam como amigos, ou seja, que se comportam com a mesma imaturidade que eles têm. Precisam de pessoas que os ajudem a desenvolver competências, precisam de orientação, de cuidado, de pessoas que ou auxiliem a ouvir “nãos” e a lidar com toda a gama de sentimentos que muitas vezes os assolam de forma arrebatadora.
Pais são aqueles que não só colaboram na construção de uma sociedade, mas que também são responsáveis pela sua manutenção. Quando nos sentimos em uma sociedade caótica, valeria a pena olharmos para a nossa casa e avaliarmos se o caos não está iniciando e sendo mantido dentro de nossa própria família.
Agora, só uma perguntinha: quando foi a última vez que você sentou com o seu filho para um papo sem compromisso e se dispôs verdadeiramente a ouvi-lo? Sentar e poder ouvir seu filho pode parecer pouco, mas é uma enorme contribuição para o desenvolvimento dele e também da sociedade. É o acolhimento necessário para o desenvolvimento de qualquer indivíduo que antes de encarar o mundo precisa saber que pode contar com um espaço que seja seguro e suporte suas dores, e para os pais mais disponíveis esse encontro pode ser uma maravilhosa experiência de aprendizagem... à dois!
Valdeli e Ana Angelica

quarta-feira, 31 de março de 2010

Tragédias anunciadas: algumas consequencias do descaso com a saúde mental

Em 12/03/2010 fomos surpreendidos com o assassinato do cartunista Glauco Vilas Boas, e de seu filho Raoni Ornellas Vilas Boas, ambos cometidos por Carlos Eduardo Sundfeld Nunes. O impacto emocional desse acontecimento tomou a todos, pelos mais diferentes motivos: pela idade das vítimas, pela forma como se deu o crime, pela importância de Glauco no universo cultural brasileiro, e principalmente pela percepção de que essa tragédia poderia ter sido evitada.
Passado o período de comoção, cabe fazermos algumas considerações sobre o fato, no que se refere ao descaso que existe nas famílias, e na sociedade em geral para com aquele que manifestadamente apresenta distúrbios afetivos e de comportamento.
A mídia noticiou reiteradamente ser do conhecimento da família as dificuldades de Carlos Eduardo, bem como o fato de ser usuário de maconha. Somado a isso, havia antecedentes familiares de transtornos mentais, com uma tia-avó e a mãe tendo recebido o diagnóstico de esquizofrenia. No entanto, o comportamento da família ao longo dos anos, consistiu em uma minimização, e uma negação destas dificuldades.
As declarações dos avós, de que sabiam que o neto usava maconha “como fazem hoje 90% dos jovens” (Revista Veja, 24/03/10), é espantosa. Revela uma tendência atual da sociedade não só de não entrar em contato com os problemas, mas em justificá-los através do Outro: se todos usam, então não é preciso preocupação.
Em entrevista concedida pelo pai, a ausência de envolvimento no cuidado com o filho também é marcante. Mesmo após acompanhar o desenvolvimento da doença na mãe de Carlos Eduardo, e sabendo a sua gravidade, não impediu que o filho freqüentasse a Igreja Céu de Maria, onde era consumido o chá alucinógeno de ayahuasca, muito embora ele mesmo o houvesse experimentado e constatado os seus efeitos.
Tanto avós quanto o pai afirmam em entrevista concedidas aos demais veículos de comunicação que já haviam “tentado” levá-lo a psicólogos e psiquiatras, mas que ele se recusava a se submeter a um tratamento, por temer “ficar igual à mãe”.
A esquizofrenia é uma doença mental grave, que se caracteriza por uma grande desorganização dos processos mentais e das funções psíquicas, gerando prejuízos em todas as áreas de competências do indivíduo: na sua capacidade de aprendizagem, de interação social, de efetuar avaliações baseadas no juízo e na crítica, na capacidade de efetuar tarefas e fazer escolhas. O indivíduo pode se tornar incapaz de distinguir a realidade da fantasia. Os períodos de desorganização podem ser intercalados com períodos de remissão da doença, o que não significa que o indivíduo se curou, houve simplesmente um abrandamento temporário dos sintomas. Os sintomas dessa doença podem começar no final da adolescência ou por volta dos 40 anos, sendo seu curso crônico, levando à deterioração da personalidade do indivíduo. Sendo assim, é uma doença que necessita de tratamento médico e psicológico, de medicação e algumas vezes de internação.
Existe muito preconceito em torno da doença mental e dos tratamentos em saúde mental. Na nossa sociedade, as pessoas têm muita resistência em entender que as superações de nossas dificuldades internas não dependem de “vontade ou esforço”, na medida em que existem processos mentais que se desenvolvem no nosso psiquismo e que independem dos nossos desejos ou do nosso nível intelectual. Assim também, existe a crença infundada de que tratamentos médicos psiquiátricos causam dependência. Na verdade, em alguns casos as pessoas precisam tomar uma determinada medicação durante a vida porque detêm uma patologia crônica, que vai evoluir se não for tratada. A medicação não vai levar o indivíduo a um estado de fragilidade psíquica, muito pelo contrário, é o que vai permitir que ele possa usar de uma forma adequada todos os seus recursos pois não estará submetido a processos internos desagregadores. A necessidade de internação, em alguns casos, também deve ser entendida como um cuidado a mais, pois muitas vezes o paciente está tão desorganizado que precisa ser monitorado, precisa de cuidados intensivos que dificilmente a família pode oferecer. A internação também é uma forma de proteger o paciente dele mesmo...
É bem possível que se esses cuidados tivessem sido tomados pela família de Carlos Eduardo, essa tragédia poderia ter sido evitada. Uma tragédia que atingiu não só a vítima e sua família, mas também o agressor e sua família.
Os familiares do agressor alegam que “ele não queria” fazer tratamento, mas será que ele estava em condições mentais de fazer a melhor escolha pra ele naquele momento?
Embora seja sofrido ter um membro familiar querido com transtornos mentais, o tratamento adequado é o melhor cuidado que podemos lhe oferecer, ainda que em alguns momentos à sua revelia.
Isso é preservar a vida, promover saúde mental e evitar as dores desencadeadas por tragédias como essa.

sábado, 20 de março de 2010

Começamos assim...

20 de Março...

Zeppelin voa nas Américas
Em 20 de março de 1932, o dirigível alemão Graf Zeppelin começa a fazer vôos regulares na América do Sul. O dirigível, inventado pelo general alemão Ferdinand von Zeppelin, possuía uma estrutura interna fixa, com mesas e cadeiras, e capacidade para 20 passageiros e 40 tripulantes. Em 1662 o governo português proíbe a escravidão do índio brasileiro. Em 1957 o Conselho Nacional Suíço concede o voto à mulher.
A História nada mais é que o resultado do encontro da história de cada um. Os acontecimentos históricos deste dia 20 de março representaram conquistas significativas para a humanidade. Conquistas relacionadas à liberdade, ao respeito às diferenças, que deram voz à singularidade de cada um. Conquistas que também apontam para o movimento incessante do homem rumo ao seu crescimento e desenvolvimento!
A história desse blog também começou com o encontro de duas histórias. Foi no Instituto de Psicologia da USP que tivemos o privilégio de nos conhecer e de nos descobrir como profissionais, comprometidas com nossos pacientes, com o aprimoramento profissional e com a ética. Profissionais que buscam não somente o atendimento ao paciente que nos procura, mas antes de tudo comprometidas com práticas que possibilitem a prevenção e a manutenção da saúde mental através da promoção do desenvolvimento humano. Desse encontro, entre discussões clínicas, parcerias em trabalhos, cafés e pães de queijo, nasceu o desejo de desenvolver uma atividade que de alguma forma pudesse alcançar este objetivo. Assim nasceu esse blog, que tão cuidadosamente constituímos com o intuito não só de transmitir e tornar público o que sabemos, mas de criar possibilidades de aprendizagem mútua e constante entre nós... e vocês!
Nascemos em 20 de março. Não com a pretensão de nos compararmos com as grandes conquistas da humanidade, mas com o desejo que pulsa em podermos também contribuir para um mundo melhor, onde as pessoas possam pensar sobre seus espaços e conquistar outros tantos!
Sejam Bem-Vindos!

Ana Angélica e Valdeli