quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Algumas considerações sobre os (des) encontros afetivos

Apesar de ouvirmos com uma grande freqüência de homens e mulheres, nas diferentes faixas etárias e estratos sócio-culturais, que todos estão em busca de “construir relações afetivas”, o que observamos é que a cada dia as pessoas estão cada vez mais sozinhas e vivendo um sem-números de desencontros em suas vidas. Uma explicação bastante comum é que isto vem acontecendo em função de que as pessoas “não estão dispostas a se comprometerem”. Essas falas apontam para um dos paradoxos que vivemos neste período que os sociólogos e cientistas sociais denominam “pós-modernidade”.
Realmente é paradoxal o fato de que as pessoas buscam construir relações, porém sem precisarem se comprometer. Há uma ambivalência, que estrutura o campo da impossibilidade: onde não há envolvimento, não há construção.
Não é novidade alguma que estamos vivendo tempos de excessivo consumismo: há uma constante e permanente busca por objetos que tragam prazer ilimitado e anulem sentimentos de solidão e desamparo. Conseqüentemente, o que observamos é que também as relações afetivas se tornaram objetos de consumo. Não há a busca pelo encontro com o outro, com a alteridade, mas a busca por um objeto amoroso destinado única e exclusivamente à satisfação das necessidades afetivas individuais. Então, na medida em que este outro é alguém que também tem desejos e necessidades próprias e que também está em busca de satisfazê-las, o que se vivencia nos encontros afetivos atuais é um grande desencontro. Um desencontro entre desejo e realidade que impede a construção de possibilidades de relacionamento a dois.
Quando ouvimos, na nossa clínica, queixas relacionadas à conflitos afetivos, sempre nos deparamos com uma mesma posição: as pessoas estão sempre prontas a apontar no que o outro foi faltante e muito pouco disponíveis a refletir sobre a sua responsabilidade e suas atitudes nesta relação. Há sempre uma busca em transformar o outro naquele objeto idealizado, ainda que disfarçada sob o desejo altruísta de “querer o melhor”.
Muitas vezes podemos observar relações que são mantidas através de um vínculo perverso, agressivo e hostil, onde o único desejo que parece unir o casal é o desejo de destituir o outro de sua auto-estima e capacidade de realização pessoal.
Relacionar-se implica em estabelecer uma relação de cuidados e o que percebemos é que as pessoas querem ser cuidadas... Mas não querem cuidar.
Cuidar não significa “ser responsável por”, mas ter consideração. Considerar o outro nas suas necessidades, nas suas diferenças, nos seus desejos.
Toda relação envolve uma certa quantidade de frustração, mas devemos avaliar se aquilo que chamamos de frustração na relação não esconde, na verdade, uma falta de comprometimento e de responsabilização pessoal pela própria existência...

Um comentário:

  1. Gostei muito do texto, afinal é assim que percebo os relacionamentos à minha volta hoje em dia: um acessório, um item para combinar com a bolsa, o sapato ou o relógio. Ninguém tem tempo para se doar, ser inteiro, descobrir-se e descortinar-se ao outro. Muito bom texto, aliás, como sempre! Um abraço, Água

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